Carta-discurso do escritor e maçom italiano Giuseppe Mazzini ao Papa Pio IX, refutando e contestando suas acusações e ataques à Maçonaria.
“Na vossa última encíclica lançastes um anátema ao
mundo civilizado, à sua consciência, à vida que o alenta, como se esse mundo,
essa consciência e essa vida não fossem a obra de Deus.
Qual um náufrago, que
sentindo a água subir ao pescoço, se despoja de tudo para buscar a salvação;
assim vós, sem esperanças, arrastado pela agonia do pecado, vos despojais de
toda a espiritualidade, de toda a santidade e de tudo o que torna vossa
autoridade grande e eficaz.
Perdido na inconsciência da razão, incapaz de vos
sustentardes um dia sequer fora do recinto de vossas baionetas, não sabeis mais
corrigir-vos, nem resignar-vos; e morreis… a mais horrível das mortes…
maldizendo.
Negais a moral, contestando-nos o dever de trabalharmos em prol do
bem-estar da humanidade, e entregando nossos Irmãos ao império da tirania, da
injustiça, da ignorância, dos preconceitos e dos erros.
Não abraçais senão uma
causa: que deveríeis ser papa e rei, sem obrigação alguma para com a
humanidade.
Hoje não reinais pela fé e sim pela força; vossos servos são
corrompidos e corruptos; vós, enquanto abençoais aos aventureiros que guardam
vosso santuário, não tendes uma sequer palavra de consolo para aqueles que
lutam pela liberdade, igualdade e fraternidade.
Os povos porém não se dirigem
a vós e sim a nós; a nós, precursores da nova era que desponta, a nós que, com
a palavra e o exemplo, lhes ensinamos como devem cumprir a lei de Deus sobre a
terra.
Não; vossa Igreja não reúne senão uma fração de homens que diminuem
cada vez mais. Vossa autoridade não mais dirige, regenera, reanima a vida.
A
Deus, e não a vós, os povos pedem o alento para a vida e o consolo para a
morte.
Os mártires do dever se encontram entre os que vós chamais de
excomungados; os que lutam pelas causas do povo se encontram entre os que vós
chamais de hereges; os que pregam as santas doutrinas se encontram entre os que
vós chamais de ateus; não vos resta senão mendigardes para viverdes,
maldizerdes para serdes ouvido…
Ocupais um trono sobre o qual já não sois
Papa… e sim vulgar tirano, sustentado pelos soldados de outros tiranos.
Como
Papa, pesa sobre vós o abandono de todos os preceitos de Jesus, a sacrílega
comunhão com todos os poderosos da terra, a idolatria da pompa substituída ao
espírito da religião.
Como rei, pesa sobre vós o sangue de Roma e a
impossibilidade de permanecerdes nela um só dia sem o amparo da força bruta.
Reconciliai-vos
com Deus; com a humanidade já não podeis.
Giuseppe Mazzine
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