domingo, 4 de julho de 2010

As Opiniões


Quando me manifestei com tanto ardor contra a opinião, estava ainda sob o seu jugo, sem me aperceber.
Queremos ser estimados pelas pessoas que estimamos e, enquanto pude julgar favoravelmente os homens, ou pelo menos certos homens, os juízos que eles faziam a meu respeito não me podiam ser indiferentes.

Via que os juízos do público são muitas vezes justos;
mas não via que essa justiça resultava do acaso, que as regras sobre as quais os homens fundamentam as suas opiniões são extraídas apenas das suas paixões ou dos seus preconceitos, que provêm deles, e que, mesmo quando ajuizam bem, é frequente que esses bons juízos nasçam de um mau princípio, como acontece quando fingem honrar, a propósito de algum sucesso, o mérito de um homem, não por espírito de justiça, mas para se dar ares de imparcialidade, ao mesmo tempo que caluniam à vontade esse homem relativamente a outros pontos.

Quando, porém, após longas e vãs pesquisas, vi que todos eles, sem exceção, se mantinham dentro do sistema mais iníquio e absurdo que um espírito infernal pode inventar;
quando vi que, a meu respeito, a razão fora banida de todas as cabeças e a justiça de todos os corações;
quando vi uma geração frenética entregar-se totalmente à fúria cega dos seus guias contra um infortunado que nunca fez, nem quis, causar mal a ninguém;
quando, após ter em vão procurado um homem, fui obrigado a apagar a minha lanterna e a exclamar;
 já não os há;
comecei então a ver-me sozinho na terra e compreendi que os meus contemporãneos eram, em relação a mim, nada mais do que seres mecânicos que não agiam senão levados pelo impulso e cuja ação eu só podia calcular pelas leis do movimento.

Fosse qual fosse a intenção, a paixão que eu tivesse admitido existir nas suas almas, jamais teriam explicado a sua conduta para comigo, de forma que eu pudesse entender.

Foi por isso que as suas disposições interiores passaram a não significar nada para mim;
passei a não ver neles mais do que massas que se movimentam de diferentes maneiras, desprovidas, a meu respeito, de qualquer moralidade.
Jean-Jacques Rousseau

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